À dela!
É mais ou menos do conhecimento geral que na passada sexta feira dei o primeiro passo de uma longa viagem, quando decidi finalmente começar o projecto que adio há tanto tempo.
Mas, e não há como negá-lo, é algo que assusta um bocadinho. Foram anos de faz! faz!faz! e eu nepes, que quem tem cu tem medo e eu visto o 42 de calça.
Mas isto é tudo liminarmente ridículo, esta vida é tão éfemera que é um desperdício de tempo deixarmo-nos bloquear pelo medo (tenho de comprar o Flip, acho que acabei de dar outra calinada...)
E, se isso não fosse algo óbvio, no passado sábado estive com uma amiga de looonga data, e que já não via há algum tempo.
Conhecêmo-nos em 1987, quando ingressámos as duas no CITEM, no curso de estilismo. Fizémos o curso juntas, e formávamos um pequeno grupo éterogeneo, juntamente com mais duas pessoas: o Ricardo e a Isabel. Curso acabado, por razões que não interessam nada para aqui, o Ricardo afastou-se, a Isabel adoeceu e faleceu com leucemia, estando eu grávida da minha filha.
(a Isabel foi a minha melhor amiga desde sempre, e o facto de estar aqui a empurrar o assunto às três pancadas, só quer dizer que ainda me dói, e não quero mergulhar na tristeza, hoje não, hoje não posso...)
A João (acredito que ela não se importe de eu usar o nome...), ficou. Como não morávamos perto, fomo-nos contatando por telefone, e bom, os anos passaram. Há dois anos, mais ou menos, andava eu nas compras no Continente e para meu espanto, estava ali a João! Ainda fui abordá-la a medo, com um "desculpe..." que às vezes as semelhanças traem-nos, mas quando ela se voltou e olhou para mim deu uma gargalhada do "desculpe..." e abraçámo-nos aos pulinhos, como duas malucas. Foi bom demais! Acontece que agora ela tinha também uma casa nesta banda, e volta e meia estava aqui, e passámos a encontrar-nos de mês a mês, ou nem isso, mas voltámos a ver-nos.
Até que, há pouco mais de um ano, ela me disse que tinha sido submetida a uma histerectomia, depois tinha sido feita nova cirurgia exploratória, baseada nos resultados dos exames que tinha feito, e tinha sido decidido que ia começar a fazer quimio. Quando a voltei a ver, as longas madeixas negras que a caracterizavam já não existiam, tinham dado lugar a um pente dois, pois que começava a quimio no dia seguinte.
Fui acompanhando as semanas in e as semanas out (as out eram aquela em que fazia as sessões e a imediatamente a seguir, semanas em que nem o telefone atendia), e eu tentava acertar nas in, para ir acompanhando o processo, e dando uma força. Às páginas tantas, baralhei-me toda, perdi-me nas semanas, e às tantas, fiquei com medo de lhe ligar, medo que crescia com o tempo que passava, medo de que não fosse ela a atender...
Este final de ano, enviei-lhe uma SMS, tentando não pensar muito nisso, mas apavorada se a resposta não viesse... e não veio. Até sexta-feira passada, dia 9, em que fui acordada por um telefonema dela.
E depois, encontrámo-nos no sábado.
Venceu.
Sem nunca ter desistido, sem nunca ter descarrilado, a João venceu. Já tem cabelo (já está bem maior que o meu, mas ela sempre teve um cabelo grandão, e eu sempre fui adepta do curto, ou, no máximo, médio), já teve autorização do médico para voltar ao ginásio, já está a trabalhar... e tem um novo mantra: "...mas estou viva!".
Eu -"estou mais gordinha..."
Ela -"mas estás viva, não estás? Então o que é que interessa se estás mais gordinha?"
E mái nada!!!
Há pessoas assim. Que agarram a vida pelos cornos e não largam.
A minha amiga João é assim.
Fátima