Eu e o dinheiro
Tenho uma relação muito extrema com o dinheiro: não lhe ligo nenhuma. Não lhe dou mais valor que aquele que ele tem de ter.
Fui habituada a tê-lo, como pagamento pelos abusos psicológicos (e não só, mas principalmente) de que fui vitima durante a minha infância e adolescência. A minha mãe maltratava-me num dia, no seguinte ia-mos às compras com carta branca. Ela ficava em paz com a consciência dela, e eu ficava com a sensação que não me tinham dado nada, porque eu tinha ganho o direito a ter tudo aquilo.
E tudo o que o dinheiro podia comprar, membership no health club com direito àquelas merdinhas todas que hoje se fazem nos SPA's, e banho turco, e sauna e jacuzzi, e piscina indoors, e o diabo a sete, era fundamentalmente solitário. Passei por todos esses luxos sozinha, e às vezes nem lá metia os pés. Aprendi, à minha custa, a fazer TUDO sem companhia, e a não sentir falta de gente. Passava os dias sózinha, almoçava, ia ao cinema, ao clube, e tudo dentro do Amoreiras. Em silêncio, não tinha ninguém com quem falar. Dias inteiros.
Ou seja, eu afirmo peremptoriamente que O DINHEIRO NÃO COMPRA A FELICIDADE. Mais: o dinheiro e a felicidade estão nos antípodas um do outro.
O dinheiro, ter, gastar, comprar coisas de que gostamos, pode dar-nos alegria, satisfação... mas não felicidade.
Felicidade por mim é quando eu estou a ler e a minha gata me obriga a pôr o livro ou revista de lado porque se deita sobre o meu peito e olha para mim com adoração, como se fossemos só nós duas.
Felicidade é ter o meu marido do meu lado e ele ser a pessoa fabulosa que é, termos vivido tudo o que já vivemos.
Felicidade para mim é quando os meus filhos me fazem miminhos, dão beijinhos, me dizem que sou a melhor mãe do mundo...
E quanto é que isto custa? Quanto é que vale?
Podemos escolher passar pela vida de couraçado vestido e a olhar através de um funil invertido, ficarmos o tempo todo sentados no rebordo a olhar para o buraco, e não ver mais nada, sentir mais nada. Ou não. Tentar dar a volta ao buraco, ou, em última instancia, olhar para cima e ver o céu, para o lado e ver o verde da relva...
Já lá dizia o outro "Se choras por não ter visto o sol, as lágrimas vão impedir-te de ver as estrelas".
Claro que o dinheiro faz falta. Na medida certa, alimentação assegurada, tecto sobre a cabeça, saúde garantida, e nada de andar roto na rua. Quanto ao resto, cada um terá as suas prioridades, as coisas que lhe dão prazer, mas que, pensemos lá atentamente, até se consegue passar sem elas! Não são elas que nos fazem felizes. Pelo menos a mim não é.
Sim, afectam a qualidade de vida, e um nível decente de qualidade de vida faz-nos andar muito mais satisfeitos.
Mas ir jantar fora todos os fins de semana, comprar tudo o que me desse na bolha, e não ter os meus momentos de pura felicidade como os que expus acima (há mais... há muitos mais...) Jamais. Ou como diria o outro, jamais (leia-se jámé).
Nunca fui tão feliz como quando deixei de ter dinheiro,
Fátima