A fugir com o rabinho à seringa...
... mas já vai sendo altura de perder o medo e falar de coisas sérias, sem receio que elas mordam.
Todos os anos, em Setembro, sinto aquela sensação de agenda novinha, um ano inteiro novo-e-a-estrar, cheiro a livros novos (reminiscências do meu tempo de escola, talvez...), recomeço, sempre, todos os anos. Infelizmente este ano esse, que é dos melhores momentos do ano, está a passar-me completamente ao lado. Não houveram férias, ou seja, o pobre Vitor esteve três semanas literalente em casa, precisamente as três semanas que fui trabalhar para a loja daqueles idiotas. Acabaram as férias do marido, no dia seguinte a loja fechou. Não houve aquele tempo de namoro, em que os dois equilibramos os pratos da balança, e acertamos agulhas para o resto do ano - que invariávelmente é cheio de sobressaltos - mas que tem ali o seu chão seguro, tábua rasa para recomeçar em Setembro um projecto novo, igual ao anterior, mas com forças novas e coração mais leve.
À conta disso, tenho andado para aqui a sentir-me completamente perdida, sem perceber muito bem de onde venho, e assustada por saber para onde vou.
Ou seja, não tivemos o período de namoro e acerto de agulhas, acabámos por descalibrar a balança todinha (que, a bem da verdade, nunca está completamente calibrada), e quando chegámos à inevitabilidade da solução, que acordámos sem dramas, ficámos assim os dois tristes, com mais dois meses e meio pela frente, mas com um buraco no peito, com saudades por antecipação. Diz-se que só uma situação realmente extrema ns faz avançar. Vai fazer-me avançar a mim, para o "desconhecido", e deixar atrás de mim marido, filho, gatas, ratinhas. E começar tudo de novo sem criar grandes raízes, porque as raízes ficam aqui, e de lá, há sempre a prespectiva de voltar.
E é possível pergunto eu, mudar de vida, de país, se cultura, e ser capaz de ficar a mesma? Virei aqui todos os meses, matar saudades de nós três (sete), e do meu pai, sogros... mas e voltar de vez? Será tal possível? Melhor, será possível conseguir uma bagagem tão grande que me premita voltar erradicando a caixa de sapatos de vez?
"O mundo é a minha ostra", e "sou um cidadão do mundo", mais "home is where the herat is"...
Se tenho medo da adaptação. Não. Tenho, talvez medo de não conseguir virar de novo a 180º quando tal for possível, ou requerido.
Sem as férias a dois, sem a sensação da rentrée, que neste momento é "um lugar estranho", estou a preparar-me para saltar de um avião sem saber DE TODO se o pára-quedas funciona. Estou tão perdida que não quero pensar mais, as ideias e dúvidas remexem-se em permanência na mente, e eu só quero mesmo puxar a ficha da tomada ás vezes, coisa que de vez em quando tenho de fazer, já que se me vou embora para não acabar debaixo de um combóio, nem maluquinha internada numa qualquer instituição, convém não enlouquecer antes...
Esta é uma oportunidade que me deixaria feliz até à medula, não fosse o reverso da medalha. Deixar um projecto a meio, o meu filho... fiquei 18 anos da minha filha em casa, apoiei a 500%... e agora, aos 14 dele... estou aqui estou a chorar. Que o faço poucas vezes, mas faço.
Gostava de não estar nos mes sapatos. E se gostava de parar o tempo, ao mesmo tempo gostava que ele avançasse depressa, e que eu já lá estivesse... esta ambivalência dá cabo de mim.
Por isso, ficam a saber porque é que não tenho cá vindo, e quando venho escrevo sobre ratos e gatos (ou a quente sobre pequenas coisas que acabaram de acontecer). Porque isto cá por dentro vai com vagas de 10 a 20 metros, e eu estou numa casca de noz. Tenho medo, estou mesmo muito assustada. Não quero, e no entanto, no fundo, até estou deslumbrada com uma oportunidade de recomeço... que na verdade é uma ilusão, dado que no fundo, estou presa pelos cabelos do coração.